Cada vez mais a criação de riqueza no século XXI deverá basear-se na teoria dos sistemas.
O principal produto da Natureza é a vida e inteligência com valor superior ao melhor que os humanos conseguem produzir. Mas, ao contrário destes, a Natureza apenas utiliza nutrientes recicláveis e banais presentes no solo, além de água e da abundante energia solar, um processo inteligente e sustentável.
Para produzir, mas com muito menos valor, os humanos (mesmo sofisticados e modernos) continuam a produzir por extração total do planeta, esgotam e contaminam-no até à morte? Continuam a ser predadores tal como como os seus mais ancestrais antepassados. Pior. Destroem mais.
O que diferencia no modelo produtivo?
Para justificar o produto da Natureza - vida e inteligência – apresenta-se o corpo humano vivo. Os materiais que o constituem são comuns, abundantes, logo baratos. Para produzir com valor, a Natureza não precisa de terras raras ou ingredientes absurdos. Com a sua simplicidade material, o processo depende mais de outros fatores que compensam muito tal criação, são mais intangíveis, mais inteligentes, mais dinâmicos.
O processo natural emergiu e evolui a partir de fluxos trocados entre as suas unidades, desde as mais básicas às mais complexas. A partir dos nutrientes e energia emergiram bactérias, e destas seres complexos como seres humanos. Todas as unidades se ligam entre si a constituir redes estruturadas, coerentes, formando unidades cada vez mais complexas as quais satisfazem mais funções. Estas, na forma mais completa, como sistema aberto, agregam um valor muito superior ao custo das suas unidades mais elementares.
Prevalece o ciclo de vida que importa mais do que extrair para transformar. Na cadeia de valor, a contabilização de custo de fatores abrange todos os que envolvem o sistema, como os ambientes com que interage. Não se circunscreve às funções intrínsecas da produção, empurrando os custos de envolvente para os outros (humanos e Natureza).
A principal riqueza gerada pelos humanos deveu mais a fluxos (informação, bens ou energia) entre eles do que pela extração ou predação de outros. Daí a importância das cidades. Mas, no passado, a única tecnologia disponível era tangível e rudimentar, mais muscular e poluente o que implicava processos produtivos físicos, logo lentos e ineficientes.
A tecnologia atual mais baseada na informação evolui o desempenho funcional que se dissemina por fluxos eletromagnéticos o que favorece a riqueza de quem domina os processos virtuais. Neste novo âmbito, a rede económica pode simular o cérebro humano (Gomes, 2004) que opera fluxos mais bioquímicos do que físicos. Os processos virtuais ganham relevância sobre o que é real. A Internet é muito mais revolucionária do que a eletricidade, e esta já o foi em relação às tecnologias anteriores o que permitiu a civilização do século XX. Imagine-se o potencial a alcançar com a Inteligência Artificial, a computação quântica ou a engenharia genética.
Infelizmente a boa mudança será um privilégio de poucas economias, as que apostam em modelos avançados e mais desmaterializados. As outras irão preferir manter o status-quo com o modelo produtivo de sempre a inovar, mas perderão na escassez de capital, monetário e humano, arrastando-se em contínua estagnação social, económica e ecológica.
E qual o papel do imobiliário atual?
O imobiliário é crucial para a sociedade e economia humanas. Até para a existencia dos supercomputadores que criam a extrema riqueza como nunca, não teriam hipóteses na Natureza bruta. Sem imobiliário, a civilização não existe, nem economia. Ponto.
Mas, a importância do imobiliário na moderna economia não pode dever-se (apenas) ao edificado, embora seja este que contabiliza elevado peso no PIB e a construção dá emprego. Antes deve ser porque fornece os ambientes onde decorre toda a vida humana.
Tem de ser o principal motor do ambiente económico que todos podem usufruir.
O modelo produtivo imobiliário corrente é ainda muito unidirecional. Inicia na extração da matéria-prima, segue para a produção do edificado (física), mas sem grande racionalidade, com muito empirismo e tradição (ultrapassada). Incentiva-se a venda incessante do produto físico para um mercado cuja procura será cada vez mais limitada.
A extração incide sobre o planeta com recursos materiais e ecológicos limitados (poluição e alterações climáticas por emissão de CO2). Implica também a extração económica às famílias através do endividamento excessivo que se sujeitam à aquisição por carência de habitação ou à sedução pelo marketing. Resulta na extração fiscal às famílias e empresas pelo Estado, que não consegue ser eficiente nos seus próprios gastos, e usa o imobiliário para se financiar mesmo por conta do estrangulamento da economia.
Este modelo de base extrativa não tem uma preocupação em inovar ou criar valor; ou seja, em oferecer mais ao mercado com menos custos, logo maior eficiência. Prefere-se manter o status quo baseado em processos tradicionais de construção, no crédito bancário e na extorsão institucional do Estado através da fiscalidade e da burocracia.
Se o processo for mais empírico do que racional, num contexto produtivo com escassez de mão de obra, ainda por cima com baixa formação técnica e deficiente gestão, o edificado atingirá custos cada vez mais altos para todos - famílias e empresas. O endividamento perante a banca e o Estado reduz a disponibilidade para a poupança e o investimento.
A economia onde se integra o setor imobiliário terá um fim muito previsível, a pobreza e a contínua estagnação.
Mas qual o modelo sustentável a implementar?
O processo de produção imobiliária terá de ultrapassar o modelo extrativo que se baseia na contínua construção em “pedra e cal” para vender e vender. Deverá focar mais os processos que produzem ambientes que se usam e se vendem através do espaço-tempo.
A atividade imobiliária deve ser sobretudo um processo desmaterializado que concebe, planeia, gera e gere fluxos entre os agentes da cadeia de valor. A produção física é deixada para a indústria (AEC) que aplica a racionalização e a automação, melhora a produtividade.
Como sempre aconteceu, o modelo económico mais próspero é o que beneficia da dinâmica de múltiplos fluxos. Na economia de mercado resulta nas inúmeras e frequentes transações comerciais entre os seus agentes.
O modelo atual de construção para venda baseia-se em poucas transações internas no processo que cria valor, mas tem imensas no mercado de transação de imóveis. Tal só acrescenta custos de transação (IMT, mais-valias e comissões estéreis) e exclui os imensos benefícios a obter da exploração a longo prazo dos ativos.
E os ganhos do empreendedor são curtos, apenas no imediato. Terminam logo que se efetua a venda do seu imóvel. Por outro lado, os ganhos a longo prazo permanecem com os serviços de valor acrescentado e a explorar novas oportunidades que o mercado oferece na sua própria dinâmica (Gomes, 2004).
Com base neste princípio, o setor que produz imobiliário deveria desviar o seu foco atual na contínua edificação para venda a famílias e empresas para concentrar-se em ativos baseados em imóveis destinados a atração do mercado de capitais. Por exemplo, o produto poderia ser orientado para investidores institucionais que transformam direitos de posse em títulos que os representam. Tendo um valor facial mais baixo, os títulos são mais transacionáveis e líquidos.
Mudar a lógica do negócio para o rendimento foca-se investidores que procuram rendibilidade de longo-prazo, não tanto mais-valias de curto prazo. É o setor com maior expansão mundial através da Internet. Abrem-se aqui novas janelas de oportunidade para o negócio que cria valor, e não apenas no arrendamento.
As áreas do edificado transformam-se plataformas para a vendas de serviços correlacionados e compatíveis com o uso dos espaços e com a perceção de valor pelos seus utentes – os clientes. Pode criar-se assim um modelo de negócio com efeito multiplicador com resultados não lineares. O ativo imobiliário pode gerar dois negócios distintos, mas complementares, para segmentos de mercado diferentes: a venda do espaço-tempo das áreas do imóvel; a venda de serviços de valor acrescentado nesses espaços.
A razão porque o negócio passa a ser mais sustentável deve-se ao foco que deixa de ser o objeto físico para venda – o edificado imóvel – para ser a venda de ambientes e de usos em ativos imóveis.
No primeiro caso, o negócio termina na venda e exige contínua construção de edifícios.
No segundo, o negócio perpetua-se na contínua venda de serviços em imóveis que podem ser reabilitados, renovados, reforçados, readaptados, mas não demolidos. E o cliente final não está interessado no objeto físico, mas apenas nos proveitos utilitários e rendíveis.
O ativo imobiliário deve ser uma máquina que gera cash-flows que atrai investimento, sobretudo no mercado de títulos, muito mais amplo e permite escala para ganhar eficiência e competitividade a nível mundial.
Para a economia em geral este modelo seria muito mais proveitoso no sentido que foca a atração de capitais de investimento (externo) que procura ativos líquidos com rendimento, e não fica limitada ao crédito hipotecário. Este não é propenso a financiar inovação, mas antes os produtos correntes que favorecem o cross-selling, sobretudo crédito à habitação. Além disso, existe a ilusão no baixo custo do juro o que incentiva a alavancagem financeira, mas esconde um risco que é superior a todos os outros ligado à hipoteca. O empresário está sujeito a perder tudo se falhar o negócio.
Poderá existir um entrave ao modelo – o próprio Estado. Como o negócio depende de fluxos (transformados em cash-flows) todo o processo que cria valor tende a minimizar os custos de transação e mais-valias, assim como leva a recuperação do IVA. A sua ótica é de curto prazo porque perderia as fontes de imposto correntes, assim como controlo pela burocracia nos licenciamentos.
Caso a ótica governamental fosse de longo prazo e mais liberal, poderia prospetar a riqueza da nação (e a captação de impostos) pela entrada de capital externo e aumento do IVA pela multiplicação das pequenas transações devidas a vendas de serviços.
Referência:
Gomes, J. Correia, 2004, “An Integrated Process for Housing Investment and Financing – An Application in the Portuguese Context”, PhD Thesis, University of Salford, UK.
Lisboa, 19 de Janeiro de 2022
João Correia Gomes (Ph.D., Mestre em construção, Engenheiro civil)
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