Porque, em Portugal, se continua a isolar os edifícios com materiais altamente poluentes?
A pergunta impõe-se quando existem vários materiais substitutos, com vantagens físicas e ambientais. Mas, não há “milagres”: de facto, materiais como o poliestireno expandido – EPS, ou extrudido-XPS, ou ainda o poliuretano (PUR), são materiais com uma excelente condutibilidade térmica e de tão baixo custo, que se tornam atraentes para quem constrói, mas não tão atraentes, para quem habita os edifícios e ainda muito menos para o Ambiente. A questão impõe-se, ainda mais, quando estamos numa era de necessário combate às alterações climáticas e a sustentabilidade do planeta é urgente!
Fig.1 – Isolamento em poliestireno expandido (EPS)
Todos eles são provenientes do petróleo, e ocupam uma já considerável fatia de todo o lixo produzido. A ameaça maior é quando este tipo de lixo chega ao mar. Há dois problemas causados para os animais marinhos, um químico e o outro mecânico (McCauley, D.). O mecânico tem a ver com o próprio material encontrado no intestino dos animais, que é muitas vezes letal. Já o aspeto químico tem a ver com as suas propriedades absorventes, agem como uma esponja, capturando todos os compostos que mais contaminam o oceano, decompondo-se, soltam micropartículas que são então engolidas pelos animais. Sendo estes animais ingeridos pelo ser humano, está então a saúde humana em risco.
Acontece que os fabricantes destes materiais, insistem que é possível a sua reciclagem e, portanto, não são descartados. Ora se é verdade que a reciclagem é possível, já não é verdade que ele não é descartado. E a razão é simples: não há mercado que absorva as quantidades de resíduos produzidos por estes plásticos, incluindo os RCD (resíduos de construção e demolição). Ninguém conseguiu até hoje, provar que seja possível reciclá-los em grande escala pois, devido ao processo químico usado no fabrico, é quase impossível transformá-los no mesmo material que deu origem ao resíduo. Pelo que, usar a reciclagem, como argumento de sustentabilidade, é um engodo.
Mas há mais, sendo a base destes polímeros o petróleo, são materiais combustíveis (ardem facilmente), por muito que os seus fabricantes tentem provar o contrário. E é importante alertar os técnicos projetistas, as equipas de fiscalização e também os donos de obra, que a importância das soluções de revestimento em fachadas, vai muito para além da eficiência energética. Basta recordar o que aconteceu em 2017, na torre Grenfell, em Londres. Por outro lado, se em 2007, a construção em Portugal passou a “conhecer” o isolamento, devido à entrada em vigor do Sistema de Certificação Energética (SCE), não é intrínseco dizer que o mesmo foi bem aplicado, ou se o material foi adequadamente escolhido. O facto é que as casas continuam a ser frias na estação fria, ou exageradamente quentes no verão, não indo ao encontro do que se pretende com a aplicação do isolamento.
Fig.2 – Torre Grenfell, Londres, depois do incêndio em 2017
Sobre a eficiência energética destes polímeros, eu, como profissional do setor, arrisco-me a questionar se terá as mesmas características térmicas ao longo dos anos, como por exemplo, tem a cortiça. É talvez por essa razão que vemos atualmente, passados mais de 10 anos da entrada em vigor do SCE, notícias sobre o frio que os portugueses passam em suas casas. E não é necessariamente em casas antigas. Será que o isolamento colocado está mesmo a cumprir a sua função?
As questões ambientais vão entrando nas agendas políticas. O EPS, por exemplo, foi completamente banido nos EUA, desde 2016, pelos seus impactes ambientais negativos já descritos. O Parlamento Europeu aprovou em 2019 uma legislação para banir em toda a União Europeia (UE) uma série de produtos plásticos descartáveis. A proibição entrará em vigor em 2021. A questão é que, não só os descartáveis causam danos. Todos aqueles que no final da sua vida útil não possam ser valorizados na totalidade, serão descartados, como os usados em soluções de isolamento dos edifícios.
E é dentro dos edifícios que passamos 90% do nosso tempo de vida. É realmente necessário que estes se tornem eficientes do ponto de vista de consumo energético, mas ao mesmo tempo são necessárias medidas mais sustentáveis na escolha dos materiais, para bem do planeta. E o que se passa é que quem habita os edifícios, na sua maioria, não percebe nada de construção, nem de soluções construtivas, muito menos de características dos materiais que são aplicados em suas casas.
E todos precisamos de ter consciência e parar de poluir. Se continuamos a este ritmo, o mar irá conter em 2025, cerca de 1Kg de plástico, por cada 3 Kg de peixe (Ocean Conservancy). Cidadãos e governos precisam de se mobilizar, urgentemente, para travar esta avalanche de plástico que é utilizada, muitas vezes sem necessidade, porque há alternativas viáveis e não poluentes.
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Aline Guerreiro
Arquiteta CEO Portal da Construção Sustentável
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