“Em relação ao clima, encontramo-nos no ponto em que estávamos há uns anos relativamente a uma possível pandemia. Nessa altura, os especialistas em saúde avisavam que o que estamos a viver hoje com este novo coronavírus era um cenário inevitável. Apesar dos avisos, o mundo não fez o suficiente para se precaver, e o resultado está à vista, com toda a gente a correr desenfreada para recuperar o tempo perdido. Não podemos cometer o mesmo erro com as alterações climáticas.” (Bill Gates, 2021)
O Homem deu um salto evolutivo nos últimos milénios?
Na realidade, não. Na exploração de recursos parece não existir grande diferença entre a atitude do Homem de Neandertal e o Homem moderno. Como padrão (excluindo poucas exceções) a base da economia é a extração, logo primitiva similar à do caçador-recolector. As instituições proíbem o saque e a destruição entre humanos, mas são isentas quanto ao ecocídio ou à contaminação do planeta, agora efetuados numa escala industrial sem dar espaço à recuperação da natureza. Os escrúpulos e a consciência são tão escassos como no homem das cavernas. A tecnologia serve hoje em dia a eficiência destrutiva.
Apesar do progresso a economia continua a ser tão extrativa como há milhares de anos. A prosperidade da maioria no mercado global deve-se a extração ao subsolo, a morte da biosfera reduzida a matéria prima (o peixe vivo é farinha), a exploração de humanos (a escravatura não acabou). Tudo a custo zero, sem compensar o planeta ou outros humanos. Mantém-se a atitude predatória ou do saque que destrói e contamina o Bem Comum a favor de poucos, cada vez menos. Mais, em cada ano mata mais de sete milhões de pessoas por poluição, sem problema. No contexto económico, estas ineficiências são colaterais a imputar a outros (sobretudo os mais pobres e desfavorecidos que vivem em regiões de extração) e à natureza.
Apenas por essa razão, a energia de fontes fósseis que produz eletricidade ou movimenta automóveis é barata, porque na sua produção não se compensa o sistema (natural e humano).
Não se trata apenas de aquecimento global, ou destruição florestal, ou a extração sem retorno de matéria-prima e de vida selvagem no único planeta que dispomos para existir. Estende-se a toda a biosfera, um sistema sensível cujo desequilíbrio criará outra natureza, não compatível para humanos. E, não existe outro planeta. Marte não serve para um produto da natureza terreste como o Homem. Para ter uma noção da tendência atual aconselho a ver o filme Seaspiracy.
A mentalidade humana tende a viver uma perspetiva imediata, mas tem dificuldade em prever o futuro. Parece esquecer que terá de deixar um mundo ainda vivo para os filhos. Esta condição indica que, afinal, o egoísmo individual suplanta o amor filial!
Na senda autodestruidora e suicida que a humanidade já encetou, existem sinais do caos vindouro. Um “pequeno” sinal é a guerra na Síria cuja causa original é a longa seca que o país vinha sofrendo (Kelley et al., 2015) e destruiu a estrutura social rural. E o movimento migratório estende-se por todo o mundo e terá uma escala sem precedentes. Com a seca das regiões equatoriais, milhões de desesperados irão atirar-se para o hemisfério norte rico, fugir de morte certa. Esta migração massiva de desesperados não é original. O Império Romano caiu após uma situação similar. A História repete-se e é provável que a mudança ocorra após alguma hecatombe com milhões de mortes, em que pandemia do Covid-19 é apenas aviso. Nos últimos séculos, os grandes saltos de civilização (revoluções sociais e industriais) só tiveram impulso de todos após guerras globais horríveis.
Mas, existirá alguma solução?
Existe uma grande preocupação, mas ainda não se estendeu à massa de cidadãos e de consumidores que afetam a política e os mercados com as suas decisões individuais. São vários os autores de referência que descrevem o caos futuro, mas propõem soluções. É o caso de Bill Gates (2021) ou de Jeremy Rifkin (2019).
Para sobrevivermos como espécie, a abordagem terá de ser diferente e disruptiva com os costumes. Pode procurar-se a solução na máquina perfeita que é a natureza viva e, num nível mais profundo, a raiz deve estar no próprio Universo que depende de três substâncias básicas: Matéria; Energia; Inteligência.
Para já, a matéria é a única substância tangível que os humanos conseguem interpretar e usar, no seu instinto como seres que dependem muito dos sentidos para detetar o mundo. Pela mecânica quântica, os átomos não se constituem em corpos plenos de massa. Antes são estados revelados de energia por partículas ínfimas que vibram ou, em simultâneo, que criam ondas (princípio de incerteza de Heisenberg). A matéria que se revela nos sentidos humanos não passa afinal de uma expressão energética no vazio. Que ilusão!
E a energia? Também é intangível. Move os fluxos que constituem o universo físico, desde as partículas que constituem a matéria, expande o universo e move automóveis. Para tal, aplica forças fundamentais: de gravidade; eletromagnética; nucleares fracas e fortes.
O universo vive de fluxos que se iniciaram há 13,77 biliões de anos pela Teoria Geral da Relatividade quando uma minúscula partícula explodiu, o que se designa por Big Bang, e a partir daí se originou a matéria, a luz e a vida. Passou a criar valor. A ciência ainda não consegue explicar por que ocorreu. Também não explica fenómenos (que nem parecem lógicos) que ocorrem na expansão universal, como a inflação cósmica (Brandenberger et all., 2020). Stephen Hawking considerava que, antes do Big Bang, apenas existia o nada. Mas, em contradição, emerge a teoria do Grande Salto (Big Bounce Theory, 2020). Se fosse comprovada, sinalizaria a existência de universos cíclicos que se sucedem, nascem, expandem e implodem num ponto para renascerem de novo. Nesse ponto não existiria matéria nem energia (pois, sem movimento), mas algo que estimula para um novo ciclo.
Seria uma espécie de programação? Ou seja, a informação “gravada” de um processo para introduzir ordem e atributos próprios ao universo (como seja a sua forma plana), ou para instruir as partículas num padrão sujeito a forças fundamentais e às leis universais da física.
Não se pretende introduzir aqui um conceito místico, como se tratasse de Deus. Todavia, deve haver a humildade que o conhecimento humano é quase nulo. Claro que a metodologia científica será a mais correta para a descoberta. Mas, ainda requer muita paciência (tempo), esforço e perseverança. E a Humanidade já não tem tempo.
Para explicar a natureza (universo ou os sistemas vivos como a Terra ou os humanos), aponta-se, por hipótese, para uma certa Inteligência Universal. Assim, seria a inteligência a dominar a matéria e a energia (Hoffman, 2020) desde o Big Bang. É a única substância infinita que não tem recursos limitados.
Na sua própria inteligência, a natureza criou soluções multidimensionais de alta sinergia. O Homem é apenas uma solução de inteligência artificial – animal apetrechado da maravilha técnica que é o cérebro. É esta a máquina que tem disponível para achar a sua solução no desconhecido, infinito e intangível, através de atributos como a consciência, ciência, engenharia, criatividade, sensibilidade, cultura ou inovação. Por isso, na criação de valor têm maior relevância os fatores “software” e “humanware” sobre o mais tradicional “hardware” para a efetiva criação de riqueza (Gomes, 2018).
Claro que o uso (quase) exclusivo do tangível é o mais fácil para os humanos aplicarem na sua economia. Mas, num planeta fechado em que população humana atingirá em breve os dez mil milhões, a matéria e a biosfera disponíveis são demasiado pequenas. Não se importa matéria do exterior do planeta. É um sistema fechado em que as soluções terão de prevenir a mínima variação entrópica, conforme a segunda lei da termodinâmica. E atingir o máximo entrópico no contexto material significa a extinção. Todavia, não existem limites entrópicos quanto às trocas de energia com o espaço exterior, por exemplo a partir do sol. As soluções devem existem, mas teria de existir investimento na ciência e na engenharia para as encontrar e, assim, salvaguardar o planeta e a vida humana.
No futuro, as soluções técnicas podem ser livres quanto a exploração da energia (solar) e da inteligência, mas restritas na matéria-prima presente no subsolo, na água doce ou na natureza viva (como florestas e no mar). Pela tecnologia, sobretudo a bio e a nano, terá de se criar muito a partir do quase nada ou do abundante, facilmente regenerado. É o que a natureza faz muito bem e o Homem destrói. Se um dia a Natureza entender o Homem como o seu vírus mortal, destrói-o (basta a vacina certa). A Terra já responde com frequência de secas, inundações, furacões e outros fenómenos negativos.
Como poderá ser a economia do século XXI?
Para sobreviver, o conjunto da humanidade terá de apostar num modelo económico distinto. Terá de ultrapassar os fundamentos ainda baseados na mecânica newtoniana para outros como os baseados na termodinâmica (século XIX) e na Teoria dos Sistemas (século XX). A procura deve iniciar na própria natureza que é um sistema sábio com muitos milhões de anos de evolução e ajustamentos (um sistema).
Não julgue o Homem ser o único detentor de inteligência, pois tal levará a civilização a ruir a qualquer momento, ou seja, o suicídio coletivo.
A natureza regenera-se, não se autodestrói. A vida (o seu valor máximo) deve-se a fluxos diversos (energia, materiais, outros) que criam ambientes. Estes constituem os sistemas equilibrados e sustentáveis. A ideia seria criar muito com muito pouco, quase a simular o corpo humano vivo que é praticamente composto por água e elementos banais e renováveis na natureza. Nenhum produto é excluído seja energia, habitação, alimentos ou vestuário. Por exemplo, pela manipulação do RNA e outras técnicas será possível criar soluções úteis e baratas, dependentes do que é abundante. Até computadores poderão ser biológicos e muito mais potentes.
Lisboa, 21 de abril de 2021
João Correia Gomes
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