A IMPORTÂNCIA DE SE DESENVOLVER A HABILIDADE DE PROGRAMAÇÃO INSTRUMENTAL DOS ESTUDANTES E PROFISSIONAIS DA ENGENHARIA
Compartilho da opinião de que os computadores representam a invenção mais importante e sofisticada produzida pelo ser humano em sua faina existencial no Planeta. Assim como o microscópio e o telescópio nos revelaram estruturas inalcançáveis pelo olho humano, o computador, ao exponencializar a velocidade com que podemos realizar cálculos, propiciou grande parte das maiores descobertas científicas de nosso estágio civilizatório. Hoje, mais do que nunca, a evolução e a disponibilização da tecnologia dos computadores pessoais, para muito além de impactarem o exercício profissional da engenharia, demandam reconhecimento do papel instrumental que podem desempenhar no próprio modelo educacional vigente, sob cujos paradigmas vêm sendo formados os profissionais que ingressam nessa aurora do século XXI.
A assunção dos computadores como meios de atendimento das necessidades mais básicas dos seres humanos, como interações e relações sociais, diluiu num mar navegável por internautas o potencial engendrado pelo uso pleno da programação instrumental, isto é, da elaboração de aplicativos que servem como instrumento de realização automáticas de tarefas laboriosas, seja por parte dos estudantes, seja por parte do profissional de engenharia. O valor do desenvolvimento da habilidade de programar vem sendo resgatado sob o reforço argumentativo dos benefícios que o pensamento lógico-estruturado e a capacidade de abstração possuem para o desenvolvimento cognitivo, com eficácia particularmente potencializada quando a programação é inserida nos primeiros anos escolares, tendo como público alvo crianças e adolescentes. É fato que, por exemplo, no Brasil, atualmente pululam escolas de programação voltadas para esse público, tanto aquelas presenciais quanto as incontáveis instituições internacionais que disponibilizam cursos, muitas vezes gratuitos, via internet.
Voltando ao campo da engenharia, concernente à produtividade, à segurança e à precisão de resultados, não há mais porque se ocupar com tarefas repetitivas, mas, sim, com a análise balizada dos resultados fornecidos pelas modelagens processadas pelas máquinas, cuja interpretação crítica e sucessivas modificações levam à otimização das soluções e consequente racionalização do uso dos recursos naturais do Planeta. Essa impossibilidade de desvio do rumo da automatização de processos já é, desde algum tempo, bem tipificada nos escritórios de engenharia de cálculo estrutural, área de conhecimento mormente constituída de métodos e processos de cálculo exaustivos. Há muito tempo, os engenheiros que contam com os softwares apropriados para essa área profissional libertaram a mente para a nobre tarefa de concepção e aprimoramento das soluções estruturais, sem mais terem de se debruçarem sobre cálculos, cuja realização tem, no computador, o instrumento de trabalho que permite acelerar a verificação da otimicidade dos projetos. Apesar de exemplos como esse demonstrarem o quanto é inócuo resistir aos novos meios tecnológicos, perdura no Brasil, em outras áreas da engenharia prática e acadêmica a resistência, o desconhecimento ou a subutilização do computador.
Em algumas subáreas, pertencentes ou não à engenharia, o medo inconfesso e equivocado de substituição do homem pela máquina apenas se presta a perpetuar situação insustentável do perdurar de uma mediocridade robustecida, quase sempre, pela acomodação fundada na recusa de se adaptar aos novos tempos, não raramente alimentada por exemplos isolados, fracassos pontuais em que se exacerbou a crença nas possibilidades do computador, adotando-se os resultados fornecidos, sem que o essencial tenha sido feito, ou seja, a análise crítica, cujo exercício tem como pré-requisitos a experiência e o conhecimento canônico, sedimentado pelos clássicos referenciais bibliográficos.
Na atualidade, também graças ao advento e à popularização dos computadores, mesmo a experiência pode ser adquirida mais rapidamente. Afinal, reportando-nos, mais uma vez, à área do cálculo estrutural, a possiblidade de se calcularem tantas variantes quanto se queira da estrutura de sustentação de uma dada edificação, desenvolve a sensibilidade do profissional que usa o software de cálculo, aprofundando-a bem mais rapidamente do que o ritmo auferível antes dos computadores, quando a infinidade de cálculos, a possibilidade de erro e a necessária observância dos cronogramas não permitiam que se estudasse, nem de longe, o mesmo número de variantes, hoje recalculadas automaticamente, praticamente à velocidade da luz.
No nosso entendimento, o potencial a explorar com o desenvolvimento da habilidade de sistematizar conteúdos — dissecando-os até à decomposição para os rearticular na forma de linhas de programação computacional — precisa ser assimilado desde o âmbito acadêmico, adequando ou modificando a maneira tradicional de se lecionar, a começar pela identificação e separação do que vem a ser meramente um meio metodológico e o que é um fim inerente a cada disciplina. Além de romper com a não rara sublimação dos meios em detrimento da análise — a verdadeira essência da engenharia —, tal separação antecede outra tarefa, a saber, a de reconhecer e sistematizar tudo o que, no conteúdo programático, seja passível de tradução em algoritmos, passando-se a adotar práticas de ensino que reatribuam à análise a prevalência eventualmente perdida, em consequência de uma trajetória pedagógica que, pelo menos no Brasil, parece haver colocado em segundo plano o incentivo ao raciocínio lógico-analítico. Práticas de ensino dissociadas da contemporaneidade tecnológica promovem o descolamento entre o perfil dos profissionais postos no mercado pela academia e o perfil técnico exigido num mundo cada vez mais digital. Afinal, ser digital, hoje, é um conceito muito mais abrangente do que ser meramente um usuário de computador e de aplicativos: refere-se a ter habilidade de programar.
Sob o mote expresso na frase lapidar do cientista computacional norte-americano Donald Knuth (n. 1938), que define a Ciência como “o que nós compreendemos suficientemente bem para explicar a um computador” — tudo o mais é Arte —, a ideia é formar profissionais que atendam à crescente demanda do mercado por engenheiros promotores de redução de custos, aumento da competitividade pelo aproveitamento do avanço tecnológico dos computadores na solução de problemas, com a adoção de métodos rigorosos de apoio à tomada de decisão, tais como métodos de otimização para projetar e produzir sistemas e produtos de maneira sustentável, com crescente eficiência e economicidade.
FRANCISCO JÁCOME SARMENTO
Professor da Universidade Federal da Paraíba – Brasil
Departamento de Engenharia Civil e Ambiental
franciscojacomesarmento.com
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