A Humanidade parece revelar-se como a espécie melhor sucedida no planeta. Bem, pelo menos nos últimos milénios.
Tal deveu-se à sua capacidade de adaptação à Natureza e ligou-se à sua evolução genética, mental, cultural e social. O Homem atual é apenas o produto dos ambientes que o envolviam, nos quais se integrou, ou então criou em seu benefício.
Tal feito não seria possível sem transformar a original Natureza selvagem, sem edificar ou urbanizar (as cidades), sem o saneamento, enfim sem integrar os humanos em sociedades estáveis e de cooperação. Este tem sido o papel o imobiliário, uma atividade essencial para a Humanidade, não na ótica do edificar, mas antes na formação de ambientes ajustados às suas necessidades (artigo de 2 de dezembro de 2024).
Este tem sido o tema dos últimos artigos. Claro que a edificação se revela nos ambientes físicos apropriados à condição humana (artigo de 6 de dezembro de 2024), como uma espécie de filtro entre a Natureza e as Funções Corporais Humanas.
Ou, enquanto fator valorizado nos ambientes humanos (artigo de 14 de dezembro de 2024). No círculo de ambientes que o imobiliário integra, revela-se agora o papel das instituições para otimizar o produto imobiliário.
Os humanos são seres sensíveis, interativos, emotivos, inteligentes, criativos, comunicativos, empáticos, solidários. Mas, também podem ser imediatistas, egoístas, cruéis, destruidores. Como seres eminentemente sociais, desde cedo, foram obrigados a criar mecanismos de autocontrolo, sobretudo quando os pequenos grupos familiares nómadas se transformaram em tribos semipermanentes e, depois, em sociedades fixas com inúmeros membros.
Caso contrário, teriam sido extintos por grupos maiores ou então seriam autodestruídos.
A emergência da agricultura conduziu à abundância de alimentos e permitiu dispensar membros da tarefa de procurar alimento. Mas, a agricultura exigiu a construção de celeiros para armazenar os cereais e que era preciso defender de outros grupos humanos, como os caçadores-recolectores, os quais pretendiam os roubar sem ter trabalho.
A terra produtiva e os armazéns fixaram os humanos na proximidade. Alguns teriam de controlar e vigiar o armazenamento. Estes passaram a ter poder diferenciado conduzindo a estruturas sociais mais complexas e hierarquicas. Entretanto, os humanos urbanizaram-se. Para sobreviver aceitaram as estruturas de poder e hierarquia, com regras e ordem que passaram a cumprir e obedecer.
Portanto, o urbanismo deve muito à capacidade de produzir alimento (Puchner, 2024).
Até aceitaram o poder de príncipes-deuses, mesmo que por vezes eram loucos e crueis, acataram prescrições religiosas, etiquetas ou costumes ancestrais, emergiram entidades de salvaguarda e rituais que atribuíam segurança (guerreiros, igreja, universidades, burocracia).
Seriam instituições que geravam confiança de e entre os membros do grupo. Davam-lhes coesão e identidade. O espírito de grupo permitiu alavancar poder para desenvolver grandes projetos (como construir piramides ou catedrais) e enfrentar grupos concorrentes.
Certas sociedades beneficiaram da prosperidade comum, o que atraiu ainda mais humanos (por imigração) e melhorou a demografia (mais nascimentos e menos mortes prematuras ou violentas). A elevada dimensão dessas sociedades obrigou à criação de mecanismos de controlo, como a burocracia ou o sistema de justiça. Esses modelos socioeconomicos geraram crescimento, até não linear em espirais virtuosas, em relação a outras concorrentes.
Por quê? Como?
Atualmente as sociedades mais avançadas e prósperas tendem a ser institucionalizadas.
Os cidadãos dessas sociedades aceitam, mesmo que no subconsciente, as restrições e os processos institucionais que lhes garantem melhores condições de vida no Bem Comum.
Para equilibrar com os ambientes humanos, as sociedades criaram ambientes institucionais. Estes funcionam como travões (ou estabilizadores) dos primeiros, quase sempre aceleradores que podem descontrolar-se levando ao caos, conflitos, guerras e destruição.
Para funcionar com eficácia, a sociedade moderna requer regras escritas, cultura, adesão e ordem comum. Com adequada ponderação, as instituições funcionam como o lubrificante (dos mecanismos) da sociedade e da economia. Caso contrário, as instituições poderão tornar-se mais um bloqueio, emperrando os mecanismos da sociedade e da economia, estagnando-as.
Um bom exemplo de processo institucional globalmente aceite é o dinheiro, sobretudo o referente a determinadas moedas como o dólar ou o euro.
No ocidente, hoje em dia, não se paga ou recebe na transação de bens e serviços com moedas físicas (de ouro, prata, outro metal), mas através de Internet (como o Multibanco ou transferências online).
O dinheiro atual passou a ser virtual. Suporta-se na confiança e no mercado das transações.
Como salienta Harari (2024) o dinheiro é, de facto, uma entidade intersubjetiva e passa a ser nulo se não tiver mercado. Pois, na realidade, o dinheiro não existe. É mais uma construção mental dos humanos que tem de acreditar que os outros humanos também a aceitam.
Outros exemplos banais de processos institucionalizados encontram-se no governo, no comércio, no transito automóvel, no tráfego aéreo ou marítimo, no ensino, entre quase tudo. Também o imobiliário atual é um setor totalmente institucionalizado.
Além da sociedade, também a prosperidade económica de uma sociedade depende da sua estrutura de instituições como defende o nobel Douglass North (1990).
Essa estrutura assenta em três pilares: os fatores informais; os fatores formais; a autoridade. O sucesso da sociedade depende do equilíbrio desses pilares com relevância para os fatores informais sobre os outros.
Os fatores informais derivam do investimento na educação dos seus cidadãos.
Note-se que a educação é a forma mais eficaz e eficiente para manter a cultura de uma sociedade e inspirar as novas gerações para boas práticas culturais (Puchner, 2024).
Alguns países distinguem-se quanto ao foco na educação dos seus cidadãos desde a mais tenra idade. O ensino enfoca sobretudo a ética, o civismo, a cooperação (equipa e sociabilização), a arte (essencial para fortalecer a criatividade e o pensamento disruptivo), o empreendedorismo, a assunção do risco, a literacia financeira e de leitura.
Emerge assim uma harmonia “natural” dentro da sociedade com cidadãos mais pró-ativos, cumpridores, mas também conscientes do seu papel – quanto a obrigações e exigências. Estas sociedades tendem a funcionar de forma mais fluída, eficiente e eficaz, e com menos custos processuais, mais sincronizadas, mais regulares, mais solidários.
Minimizam o recurso aos restantes pilares institucionais.
Regra quase geral, estas sociedades tendem a ser mais democráticas, mais equitativas, com cidadãos mais exigentes. Tendem a aplicar mais e melhor as qualidades humanas como o conhecimento e a criatividade, a disciplina e o planeamento. Tendem a ser mais inovadoras, mais neofilitas do que neofóbicas, a registar mais patentes, a alavancar a economia com mais processos virtuais ou desmaterializados.
Exemplos atuais destas sociedades encontram-se no Norte da Europa (Escandinávia, Paises Baixos), países anglo-saxónicos (como Nova Zelândia ou Singapura), a Califórnia (EUA), ou o Leste da Ásia (Japão, Coreia do Sul, Taiwan).
Todavia, existem sociedades que enfatizam os fatores formais. Estes revelam-se na forma codificada e publicada que vai do mais simples contrato privado à constituição da nação.
Salientam-se as leis, regulamentos, normas e outras regras escritas. Alguns países abusam na produção legislativa. Porém, descuram a educação útil e eficaz, embora possa fornecer ensino com conteúdos intensivo e volumoso, pois não interessa desenvolver a razão, mas apenas a memória, evitando assim o espírito crítico.
Em alguns casos acumula e complica-se a legislação publicada, assim como a ineficiente burocracia pública (inclui o próprio sistema de justiça), talvez para beneficiar a elite de poder que tem privilégios de acesso e defesa.
Essa estrutura económica e social tende a beneficiar as elites, e com frequência ligadas ao poder do Estado, à classe burocrática, a negócios rentistas. Nessas sociedades existe elevado poder dos grandes escritórios de advogados que elaboram as leis da nação e, assim, conhecem os alçapões que servirão para defender os interesses de quem pode pagar.
Estas sociedades tendem a ser menos eficientes do que as mais dependentes de fatores informais, embora continuem a ser cumpridoras da lei. Todavia, as instituições públicas tendem a ser mais intrusivas, discricionárias, mas menos eficientes e inovadoras.
Quase todas são sociedades democráticas, mas menos equitativas, cujos cidadãos são mais desligados dos processos políticos, e com frequência pressionam para benefícios públicos.
A sua produção pode ser ainda de base industrial, mas é suportada por mão-de-obra pior remunerada do que os anteriores (baixa produtividade e gestão), embora seja competente.
Exemplos atuais destas sociedades podem encontrar-se no sul da Europa, no sul dos EUA e América Central e do Sul.
Por fim, os restantes países, talvez a maioria, seguem a linha institucional mais frágil que se suporta sobretudo na autoridade (ou na coação).
Este pilar revela-se na autoridade (e na sua força) exercida pelos setores militares, policiais, judiciais, burocráticos (como nos licenciamentos).
Todavia, em alguns países, os pilares institucionais informais são limitados para a maioria da população. Prevalece os interesses próprios e privados das elites com autoridade que atuam de modo discricionário, mesmo sem controlo. Os níveis de desenvolvimento são baixíssimos com a população controlada para suportar a pequena elite que extrai riqueza na exploração do trabalho muito barato e dos recursos naturais locais.
Nesses casos, os regimes políticos tendem a ser autocracias, por vezes cruéis, e suportam monopólios económicos com interesses extrativos. A população passa a estorvo (por vezes é aniquilada pelos próprios governantes).
Exemplos atuais dessas sociedades podem ser encontrados em África, Sul Asiático, Rússia, Médio Oriente, enfim quase onde existem imensos recursos naturais.
É possível deparar alguma correlação entre os melhores índices de desenvolvimento humano e de educação com os sistemas socioeconómicos cuja estrutura institucional foca mais os fatores informais do que os formais e autoridade (embora não os dispensem).
Por outro lado, ainda boa parte do mundo desenvolvido ou em vias de desenvolvimento encontra-se no segundo grupo (com diversas variantes e matizes).
Não parece possível enquadrar a economia portuguesa no primeiro grupo, mas antes neste segundo grupo, o que confirma as dificuldades no seu progresso competitivo. Aliás, o nível de educação e de aptidões dos adultos portugueses encontra-se numa péssima posição no grupo dos países mais desenvolvidos do mundo (OCDE, 2024). É muito mau.
Por fim, a humanidade tem ainda um enorme desafio em ultrapassar a ganância e egoísmo na maioria das sociedades que sofre pela sua exploração, poluição e guerras frequentes.
O próximo artigo desenvolve a importância de instituições para otimizar o imobiliário.
Lisboa, 27 de Dezembro de 2024
João Correia Gomes (Ph.D., REV, Mestre em construção, Engenheiro civil)
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