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Foto do escritorJoão Correia Gomes

OTIMIZAR O IMOBILIÁRIO – QUANDO O FATOR HUMANO CONDICIONA O VALOR

Atualizado: 14 de dez.

Sem a cultura, e a liberdade relativa que ela pressupõe, a sociedade, por mais perfeita que seja, não passa de uma selva. É por isso que toda a criação autêntica é um dom para o futuro.

Albert Camus


Um grupo de humanos gera um ambiente

O ambiente humano, sobretudo o atributo cultura, pode ser o principal acelerador do mercado, mas também pode ser o travão.


Entre os ambientes que envolvem os humanos, o físico é essencial. A vida tem requisitos básicos para se ajustar à Natureza por vezes agreste. Precisa do chão onde pousam os corpos e os atrai à Terra. A vida precisa de espaço, ar, água, alimentos, radiação solar e radiação eletromagnética.


A Natureza é um modelo muito avançado a considerar para a produção de imobiliário

Para evoluírem, os humanos adaptaram a Natureza aos seus fins. Surgiu a ocasião de edificar, uma espécie de filtro entre a Natureza, com os seus estados, e os humanos com as suas funções corporais. O edificado protegeu e melhorou o desempenho humano com os recursos extraídos à Natureza: a superfície terrestre; o solo; a matéria prima; a energia.

Desde a primeira civilização o edificado tem-se expressado em atributos que podiam ser detetados e interpretados pelos sentidos (visão, tato). Mas, ainda hoje a perceção sensorial tem importância na valorização do edificado.


Mas, não chega!


Apesar de imprescindível, não é apenas o ambiente físico adaptado pela simples edificação que leva ao desempenho requerido no espírito da ciência imobiliária (último artigo). Também outros ambientes influenciam o desempenho, sobretudo nos atributos funcional e económico. Se o ambiente físico condiciona a nossa existência corporal, é o ambiente humano que conduz ao progresso ou à estagnação.


O desempenho esperado num imóvel

Os humanos são seres muito gregários. Precisam de outros humanos para crescer (os bebés dependem dos progenitores), têm de comunicar, se sentirem desejados com relacionamentos, emoção, estima, empatia, amor.

Foi assim que a espécie evoluiu e distinguiu dos outros animais, desenvolveu o cérebro e a linguagem; formou afinidades de grupo para se proteger e lutar com as adversidades envolventes. Assim criaram culturas próprias que permitem interligar-se e dificilmente se afastam das culturas onde cresceram.



Os humanos gostam da presença dos outros humanos. Querem ser desejados pelos outros. Esta é a razão do sucesso das redes sociais como o Facebook ou o Instagram, um fenómeno que tem a ver com medo de morrer, algo que provém da nossa psique das cavernas – segundo Daniel Kanhneman. Para não serem excluídos, seguem o grupo e abafam mesmo a própria opinião pessoal com medo da morte.


O Humanware integra a Natureza que envolve a Humanidade e que terá de ser Sustentável

Nos agregados humanos desenvolveu-se a interação e influencia mútua, a cooperação e reciprocidade, a confiança. E é a partir dos relacionamentos que os humanos são criativos, competitivos, ávidos de conhecer e saber. Sem regras, o grupo pode comportar-se de modo caótico e surgem revoluções sangrentas. Também se juntam para causas comuns, às vezes positivas e geram progresso, outras vezes negativas como na guerra.



Os grupos criaram conceitos comuns como o Belo, a Função ou a Ordem (estes são origem da própria Arquitetura), mas também criaram a Cultura, a Ética, Valores, Língua, Política.

A atitude dos cidadãos, em geral, distingue a sociedade que prospera da que é decadente.

O desempenho de uma economia dita-se no caráter dos seus agentes e o progresso não é indiferente ao padrão das suas atitudes. Algumas questões emergem, como por exemplo:

  • Quais é padrão de comportamento da população, por exemplo, quanto à Aversão ao Risco, ao Empreendedorismo, à Inovação?

  • O sucesso dos outros gera inveja ou é um incentivo?

  • Perante as dificuldades da vida geram resiliência ou apatia?

  • Existe cultura de mérito que premeia o esforço ou é indiferente face aos privilégios de alguns (com apelido ou pertença a elite ou corporativo fechado em si mesmo)?

  • Está implantada uma cultura de exigência? (em Portugal parece confinada apenas ao futebol profissional!)

  • As ações políticas geram resposta ativa ou são indiferentes?

  • Domina o caráter individualista ou o coletivista?

  • Existe esforço pessoal em competir e vencer ou procura-se o caminho fácil no subsídio ou no relaxado emprego público?

  • Incentiva-se a literacia financeira por toda a população? Ou, prefere-se que a mesma se mantenha num conservadorismo atávico, ignorante que receia o risco e investe em depósitos a prazo em vez de alternativas como o mercado de capitais?

  • A atitude empresarial revela-se mais próxima da neofilia (cultura que acolhe a inovação e disrupção provocada pelos jovens) ou da neofobia (para manter o status-quo e privilégios das elites dirigentes, em regra mais idosas)?


A sociedade passiva tende a afastar os membros mais ambiciosos (aqueles que estudam e depois emigram), restando os que se acomodam ao status-quo e às baixas remunerações. Assim, não há disrupção. A economia e o Estado tendem a manter as empresas da velha ordem, em regra menos produtivas, mas dominadas pelas elites do status-quo. O caminho será a contínua estagnação dessa economia.



Está muito ligada à posse de propriedade (talvez um resquício da sociedade rural).

Tende a não aceitar outras soluções imobiliárias para além do conhecido e tradicional, com maior foco na construção tipo “tijolo e argamassa”, logo em processos muito artesanais, pouco eficientes.



Talvez se deva à baixa formação geral dos cidadãos, à obediência a regras transmitidas pelos ascendentes (muitos de origem rural), pelo baixo padrão de exigência, tanto na perspetiva de vida, como na qualidade do habitat em que aceita viver (Gonçalo Saraiva Martins).

É patente uma certa passividade que justifica o imobilismo socioeconómico, tem consequências na perda de renovação do tecido industrial, ou à popular adesão a empregos na função pública de baixa responsabilidade.


Qualquer mercado resulta do comportamento e perceção dos seus agentes, pois relaciona-se com o ambiente humano que integra.

Pelo lado da produção (oferta), o mercado responde de acordo com a capacidade e cultura empresarial. Se os empresários tiverem baixa formação, desconhecerem a avaliação do risco e não existir cultura de empreendedorismo, então não pode esperar-se grande dinamismo na sua resposta às necessidades da sociedade.

Pelo lado do consumo (procura), o mercado vale pela perceção dos consumidores, será pior se for mais neofóbica e passiva do que neófila e ativa.

Então, neste ambiente humano o próprio setor imobiliário será afetado.

Não consegue criar condições para melhorar a produtividade, a qual exige industrialização e inovação, o que implica a rotura com processos de negócio antiquados.

Assim, será difícil os salários crescerem e, cada vez mais, acompanharem os elevados preços (ou rendas) de habitação devido à própria incapacidade dos processos produtivos.


Em contraste, quase toda a população que carece de habitação, mesmo a maioria jovem sonha ter casa (ler artigo), mas com áreas generosas, situada em locais centrais, e talvez edificada com soluções de construção tradicional (como ter paredes de alvenaria bem estucadas similares às dos seus pais e avós).

Tendem a não aceitar alternativas ao corrente modelo de posse da habitação (a que se habituaram nos últimos 50 anos, pois antes o padrão era o arrendamento), às soluções construtivas mais industrializadas com uso de materiais processados (como o preenchimento de paredes por OSB ou placas de gesso cartonado).


Gera-se um paradoxo o qual dificulta o mercado em satisfazer as suas necessidades de habitação, mas com soluções acessíveis - preço e localização.


Os atributos de valor de um imóvel

Num mercado maduro e consolidado, o valor imobiliário é afetado pelos atributos de perceção humana, como sejam os de interligação (sobretudo as redes humanas) e os dinâmicos (nas camadas superiores da pirâmide de Maslow). Num contexto de baixa oferta de produto novo, então a disponibilidade possível cinge-se aos melhores locais e com produção cara que pode satisfazer apenas quem tem dinheiro, com elevado grau exigencial.

Como o Ambiente Humano influencia o Valor conforme a Pirâmide de Maslow

Se a maioria da população não aceita soluções construtivas alternativas nem pressiona o poder para agir de forma pertinente, então os políticos não mudam o que está instituído (como leis e procedimentos). Então, os municípios continuarão sem instrumentos de suporte para autorizar licenciamentos de soluções inovadoras, que se afastem do cumprimento do RGEU (regulamento obsoleto prescritivo, datado de 1951) ou legislação de ordenamento do território.


Se a procura atual não aceita soluções construtivas disruptivas, então não haverá mercado com futuro. Este não poderá evoluir sem inovação, sem tecnologias que são comuns em países concorrentes mais ricos. A perceção negativa da população (mesmo a jovem) pode talvez ser ultrapassado com a oferta de produto/serviço com preço radicalmente inferior ao corrente. Mas, tal exige uma abordagem produtiva distinta (ver último artigo).


A cultura humana é o pilar da sociedade que mais tempo demora a evoluir.

A mudança inicia na infância com a formação de temas como a ética, literacia financeira, risco, espírito de cooperação e competição, empreendedorismo. Tratam-se dos fatores informais de instituição proposto pelo nobel Douglass North (1990) na sua obra “Institutions, Institutional Change and Economic Performance”.


O próximo artigo desenvolve o papel das instituições no desempenho do imobiliário.


Lisboa, 13 de Dezembro de 2024


João Correia Gomes (Ph.D., REV, Mestre em construção, Engenheiro civil)


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