A otimização do setor imobiliário depende, na verdade, do adequado ambiente institucional – função intrínseca do Estado- para que os múltiplos agentes da sociedade e mercado possam agir em confiança e assim criar riqueza para todos, incluindo o próprio Estado.
O atual mundo moderno é um sistema dinâmico e complexo baseado em setores que, tão próximos de todos, são reduzidos do seu efetivo valor para a sociedade.
O setor AEC tem a função de transformar a Natureza nos Ambientes Físicos ajustados às múltiplas funções corporais humanas, como a segurança ou o conforto.
O setor imobiliário que deve prover o espaço-tempo-ambiente necessário às múltiplas funções humanas (como viver ou trabalhar).
Assim, emergem os ambientes institucionais com funções de agregar, estimular e alavancar as ações humanas por causas comuns, percepção de segurança, confiança mútua, sentido de ordem, conduzindo assim à sustentabilidade e progresso comuns.
Não é por acaso que as sociedades mais prósperas são também as mais institucionalizadas (tema expresso no último artigo).
O mercado funciona com base na permanente confiança dos seus agentes para interagirem e transacionarem bens e serviços, catalisando crescimento que pode tornar-se até exponencial (efeito matriz).
Um exemplo evidente e corrente de entidade baseada apenas na confiança é a moeda atual, atributo que apenas depende de fatores institucionais, os quais geram confiança na sociedade (ou, a nível global no caso do dólar e do euro). O mundo globalizado com moedas fortes tornou-se excecionalmente rico em comparação com o passado ainda recente.
Todavia, os fatores institucionais devem ser apenas os suficientes para gerar o estímulo na medida certa, equilibrada. Se os organismos públicos (Estado) exagerarem, por exemplo com demasiadas leis complexas ou excesso de autoridade, então perde-se a confiança sobretudo de quem realmente cria riqueza. Tais (des)medidas passam então a funcionar como travão às dinâmicas sociais ou do mercado. Provocam o efeito contrário no mercado e levam à estagnação da sociedade (basta observar as sociedades de economia planeada).
Exemplos nacionais conhecidos referem-se ao arrendamento habitacional, licenciamento ou fiscalidade. Têm sido medidas erradas, talvez oportunistas com visão de curto prazo, têm afastado os agentes do mercado português, aqueles que são realmente criadores de valor, como os promotores e os investidores em imobiliário.
Observa-se facilmente que o Estado, enquanto agente direto na economia, não tem sido capaz da decisão, gestão e base financeira para realizar diretamente os projetos necessários aos requisitos da população. O Estado como agente económico tem, quase sempre, um desempenho desastroso com custos acrescidos a pesar no contribuinte. Tal deve-se à sua máquina lenta, burocrática, que quer satisfazer todos os grupos de pressão, não conhece o negócio e os seus agentes não têm a motivação de um empreendedor.
As economias mais prósperas, são claramente liberais, pois não precisam da ação (e coação) direta dos órgãos públicos, como o Estado e o Poder Político. Estes apenas precisam de propiciar os ambientes institucionais para catalisar e atrair os agentes que fazem acontecer. Se os decisores políticos não tiverem a coragem ou a inteligência para estimular o mercado apenas com o ambiente apropriado, então o caminho será irreversivelmente de estagnação. Não apenas no imobiliário, mas sobretudo com todas as suas implicações na economia.
O imobiliário é talvez o setor mais institucionalizado de todas as atividades económicas.
Foi o que lhe garantiu o enorme crescimento que beneficiou no último século, no mínimo. Sem o suporte institucional não existiria sequer mercado imobiliário, porque o bem imóvel é muito distinto dos outros bens, móveis, que se podem guardar e transportar. Precisa de outros tipos de suporte.
Imagine-se, no passado, como seria a confiança em transacionar imóveis a estranhos fora de contextos locais onde todos se conheciam (contexto de aldeias) sem poder salvaguardar os direitos de posse de cada um, mas apenas na confiança do conhecimento pessoal.
Não existiam entidades, percebidas como independentes e idóneas, colocadas a um nível superior ao local para gerar a confiança em âmbitos mais amplos, como o nacional ou até internacional. sociedades amplas. Não existiam registos em Conservatória de Registo Predial, inscrições em cadastro pela Autoridade Tributária, procedimentos processuais por notários certificados. As transações limitavam-se ao aperto de mão, à tradição e ao bom nome das famílias ou indivíduos envolvidos! Requeria algum conhecimento pessoal, apenas possível em contextos locais, limitados.
Todavia, com a salvaguarda registal, formal e institucional, o imobiliário ganhou importância de mercado, pois favoreceu a multiplicidade de agentes em interação, logo das transações. Hoje em dia, qualquer imóvel sem os devidos registos não é considerado propriedade, logo ser passível de transação.
Nas décadas de 1970 e 1980, os investidores imobiliários perderam o interesse na construção para arrendamento até então dominante no mercado (Acciaiuoli, 2015).
Desde a primeira república decorria o congelamento de rendas, era uma medida oportunista para favorecer certas classes de funcionários públicos à custa do mercado. Todavia, a situação agravou-se nessas décadas face às elevadas taxas de inflação, mas até então era a única opção de investimento imobiliário.
Até hoje, apesar do declínio do mercado de arrendamento e falta de fogos para habitação, em contraste com outras economias avançadas onde o arrendamento ainda tem peso, os políticos portugueses nunca tiveram interesse ou coragem em reverter a situação. Afinal, são os países mais ricos e desenvolvidos que resolvem os seus problemas de habitação através do arrendamento ou soluções similares de rendimento (RENTcafe, 2018).
Talvez nada tenha mudado devido à forte pressão de associações poderosas de inquilinos favorecidos pelas rendas muito baixas ou por grupos de esquerda enviesados com interesses de estatização da economia.
O produto imobiliário com maior sucesso nos últimos 50 anos foi habitação para venda, mas teria apenas uma expressão residual sem a propriedade horizontal (estabelecida pelo decreto lei nº 40.333 de 14 de outubro de 1955) e sem o regime de crédito à habitação (1976).
Estes diplomas estimularam os agentes do mercado para avançarem e desenvolverem este tipo de negócio. Caso contrário, a provisão de habitação estaria restrita ao arrendamento e à habitação social, embora muito condicionados pelo congelamento de rendas e pela crónica falta de capital pelo Estado (que deixou de produzir habitação social para as classes menos favorecidas). Ou seja, sem tais instrumentos institucionais, o país seria um imenso território de bairros de barracas. E, o país seria muito menos desenvolvido.
Na realidade das últimas décadas, estes diplomas possibilitaram a venda de habitação a um mercado muito carente com apoio da banca. Os agentes do mercado, estimulados, enveredaram em produzir em escala. Provocaram mesmo uma reação em cadeia até à crise que iniciou em 2008.
Nas quatro décadas de sucesso produziu efeitos multiplicativos não lineares no crescimento económico do país. Conduziu à emergência de novas atividades económicas que, caso contrário, não teriam razão de existir. Com o ambiente apropriado, os agentes estimulam-se e competem com efeitos sinérgicos muito além da soma, mas mais de acordo com uma operação matricial com imensos efeitos secundários positivos.
São exemplos de sucesso que daí resultou o crédito bancário na Banca (a qual beneficiou imenso na expansão e crescimento), a avaliação imobiliária, a mediação imobiliária.
Nesta cadeia de efeitos, estas novas atividades são, por sua vez, também dependentes de fatores institucionais, então favoráveis pelo efeito de confiança gerada no mercado. Como exemplo, refira-se a avaliação imobiliária que também depende de fatores institucionais formais como o decreto-lei nº 153/2015 de 14 de setembro, além de outras certificações requeridas até a nível internacional para os avaliadores, como o REV (TEGOVA).
Hoje em dia, o mercado carece de habitação a construir com custos muito inferiores aos que o setor da construção, quase todo tradicional, consegue concretizar. Apenas é possível construir habitação acessível às classes médias a partir de empreendimentos com escala e processos de elevada eficiência como a industrialização, modelização e gestão de projeto.
Quando os órgãos políticos e públicos prometem habitação acessível, mas sem alterar as condições correntes de legislação, licenciamento, fiscalidade, apenas estão a tentar enganar a população.
Nestas condições, sem milagres, o setor da construção não conseguirá fornecer habitação acessível. A máquina instalada apenas consegue prover para quem pode pagar mais – os estrangeiros e as classes mais elevadas - como é regra de uma economia de mercado.
Antes de tudo, tal mudança exigirá uma revolução que passará pela criação de outro ambiente institucional, o tal que induza e catalise os agentes para aplicar o seu capital e conhecimento na produção e provisão de habitação acessível.
E, este objetivo de equilibrar o mercado com oferta exige de facto muito capital (que o Estado não tem, e menos terá quando for obrigado a aumentar o orçamento da defesa). Exige também regras que estimulem a inovação de conceitos imobiliários, metodologias de produção e de gestão. Não pode continuar preso a caquéticos instrumentos legislativos ou a desvarios alternativos sempre que muda um partido no governo da Nação.
O mercado imobiliário não pode limitar-se à habitação para venda. Antes, deve complementar esse produto, apresentado outros conceitos de negócio. Estes podem passar pelo arrendamento, mas sobretudo pela venda de serviços residenciais (algo semelhante aos criativos contratos de ocupação de espaço dos centros comercial que ultrapassaram o caduco regime de arrendamento comercial). Serão, por exemplo, conceitos como o coliving e de habitação colaborativa.
Apenas modelos de negócio que requerem escala e estabilidade para investimentos de longo prazo poderão cativar o capital necessário, o qual boa parte terá de provir do exterior. Todavia, é preciso induzir as poupanças internas para o investimento partilhado e acessível à população menos abastada, mas extensa - ou seja, com melhoria dos instrumentos para o investimento institucional.
No próximo artigo apresentarei propostas de alteração de fatores institucionais fundamentais para o objetivo de estimular a mudança, a inovação, o mercado, a produção de imobiliário.
Não pode ser o Estado a fazer, nem a interferir nos processos de negócio porque a sua ação direta tem provado ser enviesada e ineficiente. Mais, tal postura já provou que apenas afasta quem efetivamente compete e arrisca para inovar, fazer e fornecer.
A riqueza da economia está na intensiva interação dos muito membros de uma sociedade (e mercado), tanto do lado da oferta como da procura, não na mente superior de quem governa uma nação. Mas, a função do Estado é essencial quando cria e proporciona o ambiente em que todos investem e operam com confiança e vontade.
Lisboa, 4 de Janeiro de 2024
João Correia Gomes (Ph.D., REV, Mestre em construção, Engenheiro civil)
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