Apesar da perceção corrente nem sempre criar mais valor do empreendimento imobiliário implica maximizar a área de construção ou apontar para produto final mais caro. Valor não é receita bruta pela venda no mercado, mas antes uma margem atualizada pelo tempo e risco. Além da dimensão e construção física, outros fatores poderão contribuir ainda mais para a multiplicação do valor do projeto imobiliário. São, por exemplo, a inteligência, a criatividade, o método ou a tecnologia.
A solução mais otimizada pode exigir menos intervenção (física).
No contexto atual, valor deve ligar-se a sustentabilidade. É necessário preservar as condições naturais do planeta, consumir menos matéria prima e fóssil para a energia, além de equilibrar com requisitos sociais e económicos. Os processos económicos são determinantes para esse objetivo. O paradigma pode ser diferente, num modo de processar menos no mundo real, mas compensar por ações nos meios virtuais. Menos é mais (Hickel, 2020). Por exemplo, para quem procura um veículo para investir os seus capitais em todo o mundo, valor refere-se mais à rendibilidade do ativo ou à rentabilidade do capital investido, e não ao total das vendas ou receitas brutas.
O imobiliário é o fornecedor e gestor dos ambientes e plataformas para serviços aos humanos. Com a economia e a população expandiu imenso na superfície do planeta, mas reduziu o espaço natural que equilibra o ecossistema. O imobiliário é core para a sustentabilidade, mas terá de se diferenciar da forma que ainda pratica.
A maioria das atividades económicas dependem ainda demasiado da matéria extraída ao subsolo e por efeito contaminam o ambiente natural em que existimos. A tecnologia permite compensar, reduzir e reutilizar o material (escasso) a partir da inteligência e interação humana. E esta permite alavancar o conhecimento e a criatividade para patamares que são infinitos. O processo de desenvolver um negócio na ótica do sistema implica retirar peso ao que é material (Hardware), mas incrementar o imaterial (Software e Humanware).
O imobiliário é o setor que fornece o espaço e ambientes apropriados para os humanos. Abrange todo o planeta que ocupou. São cidades, parques, vias (estradas, ferrovias), produção (alimentar, industrial, energia, florestal), logística (portos, aeroporto, mar e espaço aéreo). Configura-se como um dos maiores responsáveis do estado atual. Será também um dos principais contribuintes para a mudança sustentável.
Para ser mais sustentável, a criação de valor (imobiliário) deve relevar abordagens a integrar, compatibilizar e aplicar em simultâneo. As soluções de negócio mais sustentáveis requerem: Visão Teleológica; Foco no Processo e seu Planeamento (este integrado num processo de gestão); Enfâse no Método de Valor Residual e nos Cash-Flows atualizados; Preferência de ações com prefixo “re” às “des”; Expansão do mercado de utilizadores.
A Visão Teleológica
A teleologia é uma escola filosófica que procura identificar as metas, fins ou objetivos últimos que guiam a natureza ou humanidade. A finalidade é como o princípio explicativo fundamental das organizações e da transformação dos seres na realidade. Este deveria ser um princípio para qualquer projeto de negócio, nomeadamente no imobiliário (promoção e gestão).
Antes da execução de ações reais, quase sempre com consequências irreversíveis e custos elevados, quer o empreendimento como o produto deveriam ser concebidos quanto a fins ou objetivos. Trata-se de intervenção racional e criativa, no âmbito do virtual, cujo resultado é quase sempre reversível e com baixo custo.
O promotor imobiliário poderia mesmo considerar 20% a 30% do seu tempo para a criação e apuramento do conceito (Gomes, 2018, p. 271). Esta fase do processo implica a procura de informação sobre os contextos (mercado, local, licenciamento), custos, marketing, estudo de mercado, pesquisa e inovação, esboço de plano.
Foco no Processo e seu Planeamento
Após a definição dos objetivos do projeto, é preciso focar no processo para o concretizar. Trata-se de alinhavar por método racional e codificado (software) todos os fluxos necessários à melhor criação de valor, desde as interações dos agentes aos capitais ao longo do projeto. Permite despistar muitos erros, incongruências, ineficiências para a otimização do processo, ainda numa plataforma virtual, com consequências reversíveis.
O foco no processo começa na própria natureza. Spitznagel (2013, pp 129) menciona a tenacidade das coníferas que investem no próprio processo de implantação e crescimento. Apesar de implicar algum atraso no início, depois acelera, e ultrapassa a concorrência de outras espécies mais frondentes. Pela mesmo foco no processo atribui o sucesso de Henry Ford no início do século XX em relação à concorrência produzindo automóveis acessíveis aos seus trabalhadores e à classe média. Este terá de ser o melhor caminho para a industria do imobiliário que procura a eficiência e a otimização.
Surge o papel essencial do Plano de Negócio, expresso em linguagem codificada e objetiva - palavras, números e gráficos -, que trabalha o projeto numa sequência regressiva a partir dos objetivos finais (conceitos) a atingir esboçados. Além da otimização do valor a criar no projeto e a mitigação de riscos e instrumento para a gestão do projeto, configura-se como peça de elevado valor de comunicação para atração de capitais para investimento, sobretudo externos.
Enfâse no Método de Valor Residual e nos Cash-Flows atualizados
Com as abordagens mencionadas requer-se combinar um método de avaliação do projeto. Este tem de ser compatível quanto aos valores que evoluem ao longo do empreendimento que dependem de custos de capital, dos variados riscos, do mercado e do próprio processo. A análise é regressiva desde o fim a prever até ao momento atual em que decorre o estudo.
Emerge o conceito de valor. Interessa a visão que satisfaz o investidor pois, além da satisfação dos requisitos do mercado (fim na forma de conceito), interessa captar capital para financiar o projeto imobiliário que é sempre de longo prazo.
Com os fluxos de caixa atualizados (DCF) em que se estima o valor do projeto ao longo do tempo, a sua otimização não se restringe ao máximo valor de venda de acordo com o mercado ou das receitas que derivam do uso e exploração dos imóveis. Se for este o objetivo de valor então o promotor irá focar e preferir na construção a novo, demolindo até bons edifícios em condições que careceriam de alguma reabilitação. A regra passa a ser demolir para construir novo (ou fingir reabilitação) para atingir os preços mais elevados do mercado.
Pelo princípio do DCF, o máximo valor não tem de corresponder ao máximo preço final. Interessa muito mais a margem, ou diferencial entre as curvas das receitas e dos custos, atualizada com a integração de variáveis de custo do tempo e do risco. O valor final até pode não ser elevado proporcionando vendas para segmentos de mercado muito mais extensos, como jovens e classe média, o que mitigaria riscos de mercado e negócio. Mais, na produção pode preservar-se os valores intrínsecos do edificado existente que não é demolido e depende de menores obras de reabilitação e modernização. O licenciamento pode ser mais simples, mas menos demorado, reduzindo o tempo de uso do capital e o risco, o que melhora o ROIC.
Por vezes, a solução que cria mais valor para o investidor imobiliário passa por fazer menos no empreendimento real em que os custos são elevados, mas não excluindo as atividades de suporte racional como o planeamento, a arquitetura, a engenharia e a gestão (regra geral com custos muito inferiores aos de construção a novo).
Preferência de ações com prefixo “re” às “des”
Com base no conceito de valor estimado a partir do DCF e para a satisfação de critérios ESG para responder às alterações climáticas e meio ambiente, é necessário mudar atitudes para um novo modelo económico. O novo modelo económico deveria copiar mais a natureza do que o comportamento da sociedade humana. A primeira entidade é muito mais inteligente e da qual a segunda é parte. Se a primeira altera muito, a segunda pode extinguir-se, apesar da ilusão que é rica.
A atitude nos processos económicos, compatível com o contexto da natureza, deveria focar a regeneração, reutilização, recuperação, reabilitação, revisão, e outras tantas ações que dependem do prefixo “re”. Por outro lado, a atitude deveria evitar as ações ainda tão correntes na economia atual como a destruição, demolição, desperdício, displicência, desprezo (pela vida natural) e tantas ações que iniciam com o prefixo “de”.
Expansão do mercado de utilizadores
A sociedade de mercado cria valor através dos fluxos entre as unidades económicas, desde humanos às suas organizações. Não se espante que os negócios mais prósperos são os que dependem de fluxos mais céleres, mais ubíquos, mais universais. A fluidez da informação através da Internet ditou o domínio do mercado por negócios que dependem de informação, desde os Bancos a empresas como a Amazon, a Google, a BlackRock. Interessa expandir o número de clientes e assegurar que estes transacionem muitas vezes, durante muito tempo.
Para vencer no contexto da transformação digital o negócio imobiliário terá de ultrapassar o modelo tradicional de construir para vender numa única transação, sem beneficiar dos ciclos interativos (apenas a banca ganha com este modelo quando capta o longo prazo no crédito à habitação e no cross-selling). O novo modelo de negócio imobiliário deve focar o cliente que usa intensivamente o espaço-ambiente (Gomes, 2018) no prazo mais longo, e nele investe através de veículos titularizados transacionados na Internet ou pelo Blockchain.
Lisboa, 06 de Maio de 2022
João Correia Gomes (Ph.D., Mestre em construção, Engenheiro civil)
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