UMA CONVERSA COM GIZELA N, NA SUA RECENTE EXPOSIÇÃO "CAMINHOS DO SILÊNCIO"
Gizela Nogueira de Almeida, de nome artístico “Gizela N”, fala-nos da sua forma de ver a arte, das histórias que conta através das obras, e da exposição que ocorreu em Fevereiro deste ano no Cais 16 – Craft Gallery em Cascais. “A arte pode funcionar como uma válvula de escape para manter um maior equilíbrio emocional tanto daqueles que a “consomem” quanto dos que a produzem”. Concorda?
A Arte remonta aos primórdios da existência. Fazer, imaginar, sonhar, colocar as primeiras impressões digitais no mundo. Fazer do mundo, um mundo sustentável, não só na palavra moderna que agora encerra, da reciclagem etc., mas fazer do mundo e da vida, um mundo de pura experiência vivencial com tudo o que ele tem para nos oferecer. Expandirmos a nossa energia positiva para que vivamos o melhor possível enquanto vivemos, dar e receber o “sentido da vida da nossa existência”… penso que sem arte e criatividade noutras formas de existência seria muito mais inviável vivermos aqui. Portanto a Arte é terapêutica, para quem faz, e para quem usufrui. É essencial à vida! Os apoios à Arte têm que ser cada vez maiores e urgentes. Pois vivemos uma época de muitos desequilíbrios emocionais.
GIZELA N, que emoções espera transmitir aos espetadores da sua arte?
A Minha Arte tem sempre inúmeras mensagens. Tenho momentos muito sofridos quando a realizo. Pois penso muito, sinto muito, vivo muito. Sou muito intensa nos meus sentimentos e pensamentos. Mas também sou cada vez mais pragmática e isso tem aligeirado muito a minha intensidade de viver, para conseguir viver com mais leveza e conseguir-me realizar sem culpas. E estou muito feliz com isso. Deve ser da “idade”, estou a ficar “madura”, finalmente (lol). Espero que com as minhas obras, consiga que os espetadores desacelerem um pouco, usufruam com calma as histórias que lhes conto, que se sintam tocados na alma, que os façam sonhar e pensar. Espero que as minhas obras conversem com eles.
Tem realizado diversas exposições por diversos países. Quais foram para si as principais exposições?
As exposições internacionais que fiz foram basicamente de “Medalhística”, pois pertencia a um grupo das Belas Artes chamado “Volte Face”, e que através da FIDEM ( Federação Internacional de Medalhística), fazíamos exposições itinerantes essencialmente pelos Estados Unidos, Japão, Finlândia etc…participei numa exposição coletiva de Escultra em Espanha (Zafra), mas todas as outras, coletivas e individuais foram em Portugal.
Temos curiosidade em saber, em particular, qual o significado do nome da próxima exposição “Entrelinhas”?
A próxima exposição era para ter o nome ENTRELINHAS, mas ficou CAMINHOS DE SILÊNCIO. Passo a explicar, “Entrelinhas” foi o nome que me surgiu enquanto pintava as minhas “linhas”. Estou sempre à volta das linhas, quer de lã, quer pintadas, quer escritas, quer coladas, quer esculpidas… entrelinhas parecia-me simples, e dizia tudo, pois significava que havia algo que não se lia, mas que se entendia. Ou seja, o significado do que se lê nas entrelinhas. Hoje, com a democracia, este termo já não é muito usado, nem sei se os jovens sabem o que é. Quando apresentei na galeria esse nome para a exposição, foi-me dito que “entrelinhas” não contava uma história, podia não aquecer a alma, como os meus quadros fazem…. fiquei a pensar…e não queria nada que isso acontecesse, e, cedi, pois encontrei um nome que também me faz muito sentido….”Caminhos de silêncio”. Porque também foi isso que senti, ao pintar todas estas linhas na tela. Senti uma espécie de meditação, de silêncio. Cada linha era um caminho que me apaziguava a alma, me acalmava. Por vezes não, por vezes tinha explosões e muitas angústias pois não sabia que caminho havia de seguir. Cada dia o trajeto que a mão fazia era diferente, cada linha é diferente.
E tudo isso tem a ver com o meu percurso. Estou num momento de mudança de percurso, e de encontrar a paz nesse percurso. Penso que as pessoas vão sentir nas inúmeras linhas, os seus próprios caminhos, alguns de silêncio, outros de muito ruído. Mas tal como o meu professor de yoga diz “para que se perceba o silêncio, temos todos que passar pelo ruído”.
Na sua opinião o que falta para incentivar mais o gosto dos jovens pelas artes? E que conselho daria a um iniciante nas artes?
Faltam, sem dúvida alguma, bons professores de arte. Tendo três filhas, artistas por natureza, e com experiência em escolas diversas, tenho-me apercebido da falta de qualidade no ensino artístico em Portugal. Tenho muita pena. Para quem inicia, o meu conselho é, estudar muito o passado, o que se fez, as mudanças ao longo do importantíssimo séc XX ao romper com tudo, o estar atento ao que nos rodeia, a ver muitas exposições, museus, e a trabalhar MUITO.
Só treinando, só experimentando, só fazendo, muito e muito, e muito, se chega a alguma coisa minimamente interessante. A verdadeira Arte, não é a Arte da preguiça.
E é necessário transmitir que é preciso tratar da carreira artística como se de outra empresa qualquer se tratasse.
Os artistas, por natureza, gostariam que alguém tratasse da parte burocrata, comercial, financeira, mas isso não existe. Temos que fazer tudo.
GIZELA N, como vê a sua arte e a sua evolução como artista daqui a cinco anos?
Tenho consciência que tenho que me dedicar muito para “recuperar” algum tempo em que não me consegui dedicar a 100% à Arte. Os próximos 5 anos vão ser de muito trabalho, de muita aprendizagem e evolução. Gostaria muito de estar e continuar a fazer exposições de pintura e escultura em galerias com as quais me identifico, de ter uma qualidade de trabalho cada vez melhor, de saber mais, de SER mais.
No passado a obra de arte autêntica era impossível ser adquirida pelo cidadão comum, apenas os colecionadores e amantes da arte. Atualmente assiste-se a um novo conceito, uma nova tendência, realizada por arquitetos, designers de interiores e um novo nicho de mercado nasceu (artistas plásticos e compradores). Qual a sua opinião?
Tento não perder muito tempo a pensar se o que se passa atualmente é bom, mau, ou mais ou menos. Acho que temos que aceitar o momento presente tal como é e com tudo o que encerra, de positivo e negativo. O acesso à Arte democratizou-se. As profissões ligadas à criatividade sempre se entrecruzaram e “competiram” de um modo por vezes difícil de aceitar pelos seus pares, mas é o que é. Tem havido oscilações de valorização das variadas profissões ao longo dos tempos. Do Arquiteto, do Designer que lutou muito pela sua profissão e conseguiu finalmente ter um lugar na sociedade, mas também, o acesso à tecnologia, à informação internacional transmitida constantemente pela Internet, está a levar a qualquer pessoa poder fazer e ser o que quiser sem grande formação académica.
Ninguém sabe o que vai acontecer no futuro, mas penso que o “saber nunca ocupou lugar”, e é através das variadas valências, do equilíbrio entre todas as “inteligências” que o ser humano se pode diferenciar.
Temos todos direito à beleza e à arte, mas fica um caminho cada vez mais difícil para o artista poder conquistar o seu mercado. Se por um lado o mercado é maior, também é maior a concorrência e a diversidade. E todos temos que viver no mercado.
Portanto tem que se ter mais criatividade para poder “vingar”. Estar sempre atualizado, estar sempre a aprender. Ser consistente no percurso, ter um sentido claro. Por vezes o universo também sorri com mais intensidade.
Costumo dizer que é preciso ter Fé, aquela esperança interior que nos faz avançar! E nunca parar de encontrar soluções. Reinventar-nos, sempre!
Artigo Original publicado em Huc Illuc - Aqui e Ali (pode ver aqui)
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